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sexta-feira, 01 abril 2022 07:35

Querem combater os raptos? Chamem a Scotland Yard

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Seis semanas atrás, o Governo queniano convidou o FBI americano para realizar uma faxina de intromissão estrangeira na sua soberania: combater o cibercrime. Nairobi baixou a bola, varreu fingimentos narcisistas e foi pedir socorro a quem tem competências, deixando de lado quaisquer considerandos de soberania de Estado.

 

O cibercrime no Quênia é um cancro, afectando sobretudo o sector financeiro e uma sociedade cada vez mais digitalizada. Sua indústria estava a crescer de forma assustadora, com gangues organizadas comandando a área sob visível impunidade, afugentado negócios e investimento.

 

O governo disse basta. Foram pedir ajuda à mão externa. Um pragmatismo de Estado que merece louvor. O governo de Nairobi mostrou liderança, colocando o dedo na ferida, sentindo a dimensão da sua dor e buscando a panaceia contra todos os anticorpos que impediam a capacidade do Estado em pôr ordem na casa.

 

Nosso Governo fez isso com Cabo Delgado. Quando a indústria da guerra se apercebeu de que o cancro estava corroendo até sua capacidade de sobrevivência, foi bater portas no estrangeiro, deixando de lado considerandos de soberania de Estado.

 

Não foi a primeira vez que Moçambique abraçou a mão externa numa área teoricamente sensível para os negócios do Estado e para a auto estima de nação soberana.

 

Em 1997, o governo contratou uma empresa privada estrangeira, a Crown Agents, para exercer a gestão operativa das Alfândegas. Entregamos o controle aduaneiro de bens, valores, mercadorias, meios de transporte, passageiros e bagagens a um gestor-delegado britânico, essa outra mão externa nos momentos inconvenientes.

 

Nossa arrecadação fiscal foi, pois, entregue a um estrangeiro, mas isso só foi possível porque o sector alfandegário estava mergulhado no enriquecimento ilícito, com gangues tomando liderança de um quadro perverso de delapidação do erário público, colocando em risco a sobrevivência do Estado. Há quem tapou o nariz! Crown Agents gerindo as alfândegas? Uns espiões do MI6?

 

Mas a limpeza era necessária. E a recuperação institucional um imperativo. O Governo de Chissano, é certo que pressionado pelo Banco Mundial, no quadro do ajustamento estrutural, abriu mão da famigerada soberania. Poucos anos depois e tínhamos uma nova Alfandega, quase modernizada, com nova postura ética e uma unidade de controle interno para controlar a corrupção.

 

Nosso país vive hoje um problema que exige baixar a bola como Nairobi fez em face do ciber-crime. Os raptos viraram uma indústria cancerosa, operando de dentro do SERNIC, das estruturas policiais, alimentando uma economia paralela, afugentando o negócio e o investimento.

 

Durante longos anos, o Estado vem fingindo que pode, sem apoio externo, melhorar a estrutura de resposta contra este crime. É mentira! Uma mentira sustentada por gente que tira proveito dessa indústria. Nesta área específica, nosso governo vai protelando a decisão de pedir apoio externo com vista a limpeza institucional do SERNIC, gerando a suspeita de que há sectores do Executivo que se alimentam na indústria.

 

Já chega de desgoverno! O SERNIC precisa de um abanão...nas suas raízes, de uma reforma por mimetismo institucional (tal como Nairobi fez ao convidar o FBI)...ou as elites políticas estão profundamente mergulhadas na criminalidade organizada que a melhor decisão é deixar o caos da impunidade vigorando. (Marcelo Mosse)

 

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