Director: Marcelo Mosse

Maputo -

Actualizado de Segunda a Sexta

BCI
ME Mabunda

ME Mabunda

segunda-feira, 20 fevereiro 2023 14:50

O nosso jornalismo (país) não está bem

MoisesMabundaNova3333

O nosso jornalismo não está bem. E quem diz jornalismo, diz o país, há uma relação muito intrínseca entre as duas variáveis. Não há, nem pode haver, país saudável sem um jornalismo saudável, fluorescente! O estado de saúde e de estar do jornalismo reflecte o nível da sociedade em que está inserido.

 

Na sociologia e ciência política, está plasmado que a media consubstancia o quarto poder… a par dos poderes executivo, legislativo e judicial. Mais proficiente a media, mais alto o nível de uma sociedade, sendo válido o inverso.

 

O meu amigo e colega Shafee Sidat realizou com pompa e circunstância a festa do Gwaza Muthini referente ao presente ano, com mais de cinquenta mil convidados de todos os cantos do mundo. Segundo a imprensa e os relatos nas redes sociais, conviveu-se, comeu-se, divertiu-se, dançou-se, bebeu-se e mais alguma coisa, à grande e à francesa. Até tivemos companhia de canto e dança de Itália, lá nas Europas - algo inédito na história das festas dos Gwaza Muthinis!

 

Consta que só não comeu quem não quis. E os meus colegas da imprensa testemunharam tudo e inclusivamente estiveram na tenda principal desfrutando de tudo de bom que lá esteve disponível.

 

Pois então, no lugar de se enaltecer tudo isto, pedras das mais grossas é o que se arremessou/a ao bom do Shafee! A cerimônia do Gwaza Muthini não tem nada de extraordinário, sempre aconteceu nestes nossos anos de independência - ainda que não se esteja a celebrar uma vitória na batalha, mas a resistência dos nossos antepassados. Ademais, sempre que fazemos missas nas nossas casas, há comeretes e beberetes sem fim!

 

Cúmulo dos cúmulos das pedradas… há os que viram “guerreiros criminosos" que foram “assassinar hipopótamos” para uma festança popular, “violando todas as regras ambientais e de preservação das espécies protegidas”. Ou seja, na ementa dos comeretes do Gwaza, o prato mais abundante foi a carne de hipopótamo! Criou-se e alimentou-se a ideia de que a carne deste anfíbio foi o prato mais forte na cerimônia, tendo havido mesmo publicações que quase o afirmaram directamente, ipsis verbis.

 

Espantosamente, violando-se o mais sagrado princípio da ética e deontologia da vida (não só do jornalismo), o contraditório, ninguém procurou o pacato SS, como ele gosta de assinar os seus escritos, para confirmar fosse o que fosse, ou obter mais detalhes sobre a alegada festança de carne de crocodilo... Procurou-se cimentar a ideia de um boom da carne de hipopótamo no Gwaza Muthini de 2023. Muito provavelmente com base em imagens circuladas no WhatsApp nas vésperas, mostrando dois hipos sendo transportados em uma grua é um tractor de algures para algures, mas nunca em Marracuene!…

 

Tirando um e outro… quase ninguém se deu ao luxo de procurar obter mais informações sobre o suposto abate de hipopótamos… onde teriam sido abatidos, quando, por quem, como… as mais básicas perguntas do e no jornalismo. Nada. Até hoje. E o que se vai registar erroneamente na nossa história é que na versão 2023 de Gwaza Muthini foram abatidos e consumidos dois hipopótamos sob a batuta e patrocínio do então administrador Shafee Sidat!

 

E assim vai o nosso jornalismo. Aliás, o nosso país!

 

Estava a ter algum engonhanço de fazer esta nota. Mas perdi preguiça quando, ao longo destas semanas, chegou-me aos ouvidos que um jornalista se recusou a ir fazer cobertura de uma cerimónia envolvendo um administrador de distrito, algures neste nosso imenso Moçambique, alegadamente porque este não lhe providenciara pequeno almoço… Chegou-me também um  um outro episódio não menos condenável segundo o qual uns jornalistas num outro ponto do país se tinham furtado de ir fazer cobertura de um evento porque a instituição organizadora do tal evento não lhes pagara ajudas de custo…

 

Perco palavras…

 

O nosso jornalismo não está bem! O nosso país também não está!

 

ME Mabunda

segunda-feira, 13 fevereiro 2023 17:30

Um país de comissões de inquérito

MoisesMabundaNova3333

A este ritmo, vamos ser apelidados de país de comissões de inquérito, não falta muito. Para tudo e para nada, comissão de inquérito! Mesmo para aquilo que já sabemos!

 

Aquando da descoberta, ano passado, dos escandalosos erros nos livros escolares, criámos uma comissão de inquérito cujos resultados não disseram muita coisa à sociedade. Continuamos com erros e mais erros nos livros escolares! Ante a descoberta da venda do sexo das reclusas em Ndlavela, respondemos com uma comissão de inquérito! Recuando um pouco mais, anos idos, aquando da descoberta das dívidas ilegais e ocultas, respondemos com uma comissão de inquérito!

 

A procissão é enorme. Muito recentemente, quando alguém disse, em plenária na Assembleia da República, que havia um deputado envolvido no tráfico de drogas, lá se criou uma comissão de inquérito, que, ao que se vaticinou já, não vai trazer informação esclarecedora nenhuma. Mas ela ali está, a torrar tudo do erário público: fundos, o tempo dos moçambicanos, o tempo dos próprios membros da comissão e, sobretudo, das autoridades competentes; custava o que citar a PGR para se ocupar da matéria de sua jurisdição por excelência?

 

Quando tivemos um aparatoso acidente por aí na Manhiça, criámos, em Julho de 2021, uma comissão de inquérito para, em trinta dias, nos dizer quais são as causas dos acidentes rodoviários no país, algo que a Área Metropolitana da Província também já tinha feito. E não é que não sabíamos mesmo quais são as causas dos acidentes de viação entre nós. Não sabíamos de verdade. E como não sabíamos, até hoje, Fevereiro de 2023, continuamos sem saber, apesar das comissões de inquérito que criámos.

 

Quando circulou a notícia de cobranças ilícitas em matrículas da oitava e nona classes na Escola Secundária Geral de Namacata, na Zambézia, criamos uma comissão de inquérito…

 

Comissão de inquérito para isto, para aquilo e para mais alguma coisa.

 

Agora que a Federação Moçambicana de Futebol não quis/quer premiar os “Mambas” que participaram no CHAN da Argélia, este Janeiro, vemos, qual sessão de teatro no Cine Gilberto Mendes, duas instituições em correria frenética, a acotovelarem-se a torto e a direito, na criação de comissões de inquérito, cada uma mais bem recheada que a outra, mas ambas atropelando toda a ética, racionalidade e lógica. A SED e a FMF precisam, do ponto de vista lógico, de criar comissões de inquérito? O que é que essas duas comissões vão dizer que as duas instituições não sabem? Se, elas próprias, tinham lá representantes? Que estavam lá a fazer tais representantes?

 

Vão dizer-nos que a FMF não se sentou nunca com a Selecção Nacional e estabelecerem os prêmios; vai dizer-nos que, ante esta inação e omissão da FMF, os jogadores começaram a exigir a definição do valor do prêmio; vai dizer-nos que os responsáveis da FMF, cada um a seu tempo, foi prometendo aos jogadores valores ridículos e insultuosos e sumindo de seguida; vão dizer-nos que perante a inconsequência, inconsistência e sumiço dos responsáveis da FMF, os jogadores amotinaram-se a exigir um determinado valor, motim que teve o ponto mais alto a recusa dos jogadores de deixar o hotel para o avião de regresso; vão dizer-nos que foi preciso assinar-se um acordo com os representantes da Federação, com a mediação do embaixador, para os jogadores dirigirem-se ao aeroporto…

 

É mais ou menos isto que as duas comissões de inquérito criadas pela SED e FMF nos vão dizer, se pautarem por honestidade. Simplesmente porque é o que aconteceu. É isto que não sabemos? É isto que a SED e a FMF não sabem? O Castro Jorge fez um grande favor ao mundo ao dar conta de tudo isto. A propósito, onde estiveram/estão os outros jornalistas que acompanharam a Selecção? Não vi(e)mos uma única crônica sonante sobre os acontecimentos de Argélia… estavam a beber com os dirigentes, conforme escrito num documento supostamente dos jogadores não capitães; estão tipo avestruz...

 

O que é que a Federação Moçambicana de Futebol não sabe que tenha acontecido na Argélia, se tinha lá o vice-presidente das Selecções e o de Administração e Finanças? Estes membros da direcção da FMF estavam a fazer o quê lá? Onde é que está o seu relatório. Nunca ouvimos falar desse importantíssimo documento em instituições que se prezem.

 

O que é que Gilberto Mendes e a sua Secretária de Estado não sabem do que aconteceu na Argélia se estava lá o Inspector Geral (que melhor figura poderia estar lá mais do que esta?) e a directora-geral do Fundo de Promoção Desportiva a ele (Mendes) subordinados? Onde é que está o relatório que produziram? Nunca ouvimos falar desse documento capital para uma instituição desta jaez. Estiveram lá a fazer o quê?

 

Triste, triste é que sejam quais forem as recomendações da comissão da SED muito seguramente serão inúteis, uma vez que o Governo, à luz dos regulamentos da FIFA, não pode interferir na Federação!… então, uma vez mais, estamos no teatro!

 

Facto é este, que todos sabemos: a FMF não quer dar prêmios aos jogadores. Tudo o resto, é coisa de Gungu!

terça-feira, 20 dezembro 2022 07:51

O turismo que (não) queremos!

O governo autorizou, semana passada, que o distrito de Vilankulo, na província de Inhambane, tivesse  serviços distritais de turismo, sob o argumento de que é para impulsionar o turismo naquele ponto do país. Um nkulungwani bem forte para a "sábia" decisão do nosso governo. De facto, Vilankulo precisa de uma abordagem diferente, aprimorada, estruturada e estruturante na nossa política… de turismo! As reticências traduzem as minha dúvidas sobre se temos efectivamente política de turismo, actualizada, com abordagens coerentes e eficazes dos variados tipos de turismo, bem como dos desafios actuais do país, sobretudo decorrentes das TIC’s, mas também dos nossos crônicos problemas de vias de acesso, acesso e tratamento de informação, boa qualidade de oferta de serviços e tratamento a turistas (estrangeiros ou não), os ganhos para o país e especificamente para as comunidades locais.

 

No domínio do antigo presidente Armando Guebuza, havia, na Presidência da República, seminários trimestrais de reflexão sobre vários temas da vida do país, sob organização da Dra. Arlete Matola. Que grande fórum de opiniões, discussões, debate de ideias não tinha o presidente Guebuza. Muita, mas muita ideia, sabedoria, conhecimento pululavam por alí. Só não aprendia ou se deixava enganar quem quisesse. Nisso, a actual ministra da Administração Estatal, na altura investida de Directora Nacional de Turismo, perfilou por lá para apresentar as ideias de turismo de Moçambique - não tenho em mente qual foi exactamente o tópico da sua apresentação -, mas o propósito foi dar-nos conta da situação do turismo no país. E fê-lo com classe.

 

Fui um dos interpelantes após a sua apresentação. A minha inquietação era/é que o país não tinha/tem uma posição/decisão clara e firme sobre o papel do turismo no nosso desenvolvimento. Sobretudo o turismo ambiental, vulgo de praia. Alguns países como as Maurícias, Seychelles e outros têm no turismo a base do seu desenvolvimento; ou uma fonte bastante robusta de receitas. E investem forte nas infra-estruturas turísticas, nas vias de acesso, nas políticas e estratégias de desenvolvimento deste sector. Nós periclitamos entre ter ou não um ministério de turismo e, quando temos, não se vê nem se sabe o que faz.

 

Depois da decisão do Conselho de Ministros da semana passada, mantenho a minha forte inquietação. Não temos uma abordagem clara! O que significa decretar apenas o distrito de Vilankulo como aquele que deve ter uma direcção distrital de turismo? Sabemos, aplaudimos e regozijamo-nos que Vilankulo seja um dos destinos turísticos mundiais. Mas, se Vilankulo é o expoente maior do nosso turismo em Moçambique, aceitemos então a máxima segundo a qual não há um sem dois, ou dois sem três… Se Vilankulo é o expoente máximo, há obviamente outras estâncias com outros expoentes.

 

Nestes verdadeiros termos lógicos, onde situamos Ponta de Ouro (no distrito de Matutuine), Bilene (no distrito da Macia), Inharrime (no distrito de Inharrime), Tofo, Tofinho e Céu (no distrito de Inhambane), as praias de Massinga (no distrito de Massinga), Inhassoro (no distrito de Inhassoro), Zalala (no distrito de… Quelimane), outros distritos costeiros da Zambézia, Nampula, Pemba e por aí fora… PEÇO AJUDA AOS QUE TÊM OS NOMES DE OUTRAS PRAIAS DO NOSSO MOÇAMBIQUE EM DIA!

 

Qual é efectivamente a nossa abordagem a esta multitude de situações? É declarar Vilankulo como o distrito que merece ter uma direcção distrital de turismo? Ou será a seguir declarar também Matutuine como distrito que deve ter uma direcção distrital? Depois, Bilene, mais tarde Inharrime, depois Inhambane, Massinga, Inhassoro… e por aí em diante? É essa a nossa política de turismo?

 

Por outro lado, e em termos muito práticos, o que significa proclamar que um distrito passa a ter uma direcção distrital de turismo? Quais são efectivamente as atribuições dessa direcção? O que queremos significar quando dizemos “dinamizar o turismo”? Temos nós em mente que há diferentes tipos de turismo e de qual estamos exactamente a considerar? Haverá orçamento apropriado, à altura, para essa dinamização do turismo? As pessoas que vamos colocar nessa direcção, serão as pessoas certas? Entendem de turismo? Ou será job for the boys?

 

Acho que devíamos ter uma política de turismo séria, coerente, consequente e sustentável. E declararmos o turismo como uma das bases do nosso desenvolvimento. Temos condições de sobra para tanto!

 

  1. Esta semana, vai o país e o mundo para defeso, por ocasião da quadra festiva. Assim sendo, a crónica vai igualmente para… o defeso! Voltará no início do ano político… para procurar contribuir nas políticas públicas, seu apanágio - esperamos ter contribuído para uma melhor e maior compreensão das políticas públicas sobre o desenvolvimento do nosso belo Moçambique ao longo de 2022 prestes a findar. Moçambique pertence-nos a todos nós 30 milhões. Ninguém nos vai tirar nunca.

 

Apenas duas seguintes mensagens:

 

(i) Feliz Natal! Feliz Ano Novo! Que 2023 traga melhor do que 2022. Não sei se foi este ano ou ano passado… ou mais para lá que vi as piores fotos da minha vida. Gostaria de não as voltar a ver nunca mais, a começar já em 2023. Nunca antes, em toda a minha vida, tinha imaginado que um humano pudesse fazer a outro humano o que vi/vejo nas fotos!

 

(ii) Vamos para a quadra festiva. Quadras festivas temo-las desde que nos conhecemos como pessoas. E continuarão depois da nossa passagem. Vamos celebrar com racionalidade e muita prudência. Próximo ano teremos mais quadra festiva. Nossa vida não termina no dia 25 ou 31 de Dezembro de 2022. Paremos (ou moderemos) de nos encharcar de álcool a pretexto de celebrar… álcool que, também, não acaba no dia 25 ou 31 de Dezembro.

 

Festas Felizes! Até Fevereiro.

terça-feira, 13 dezembro 2022 14:21

O exemplo de Sumia Suluhu Hassan

Conforme reza a história, a República Unida da Tanzania tornou-se independente a 9 de Dezembro de 1961. Portanto, sexta-feira passada, completou 61 anos após ter cessado de ser colônia da Alemanha desde a Conferência de Berlim e, depois, tutela do Reino Unido.

 

Como bons africanos que somos, estavam marcadas celebrações à escala nacional, festas de arromba e um banquete de estado à nossa boa maneira. Tudo orçado em nada mais nada menos que cerca de 450 mil dólares norte-americanos. Bom… para nós, moçambicanos, que, nos últimos sete anos, passamos a vida a ouvir 2.2 mil milhões de dólares… contas bancárias pessoais com oito milhões e meio de dólares, 33 milhões e por aí fora, meio milhão de dólares pode não parecer nada… até não é, comparativamente! Na nossa moeda, são uns 28 milhões de meticais! E dão para… equipar um pouco melhor um dos hospitais gerais!

 

No lugar de festas de arromba, banquetes ou festanças, decorreram o que designaram de diálogos públicos sobre o desenvolvimento! A chefe de Estado tanzaniano decidiu cancelar todas as festanças e mandar os 450 mil dólares para a construção de oito dormitórios para crianças com necessidades especiais! E não estamos a falar de aniversário qualquer… estamos a falar de sessenta e um anos de uma nação. Não entendamos mal a Sra Sumia Suluhu: ela não mandou não se celebrar o sexagésimo primeiro aniversário do seu país. Não, não! Mandou, sim, redirecionar os dinheiros que estavam para serem gastos nas festanças e banquetes. É possível festejar, celebrar uma efeméride sem gastar rios de dinheiro. Ou gastando-se o mínimo dos mínimos! Realizando sessões de profunda e séria reflexão sobre a vida e o rumo do país. E os diálogos públicos sobre o desenvolvimento são, também e por excelência, momentos importantes para e no progresso de um país! E exemplo de celebração inteligente.

 

Mas não é a primeira vez que um governo tanzaniano cancela celebrações de pompa e circunstância do dia da independência do seu Estado. Em 2015 e 2020, o então presidente, John Magufuli, procedeu da mesma forma e direcionou os fundos orçamentados para a construção de uma estrada e para a aquisição de equipamentos médicos, respectivamente.

 

Está aqui um exemplo de onde ir buscar dinheiro se queremos fazer contenção de despesas públicas, de se ser comedido e racional. Todos os dias queixamo-nos de que não temos dinheiro para isto e mais aquilo, mas passamos a vida em acções e actividades perfeitamente supérfluas e dispensáveis, ou em viagens completamente desnecessárias.

 

Assim que estamos em fim de ano, havemos de ouvir de sumptuosos banquetes de estado, festanças com convidados na casa dos milhares e com réplicas nas províncias até ao distrito.

 

Há uns bons anos, fui convidado a um daqueles banquetes de fim de ano. Ali devia haver mais de dois mil convidados, entre os chamados quadros e figuras nacionais e respectivas esposas. E alguns quadros levavam consigo filho ou filhos!... E ali comeu-se e bebeu-se pela medida grande; do bem e do melhor! Não que o chefe de Estado não possa oferecer um banquete aos quadros nacionais. Pode e deve. Mas, se o espírito é de fazer a contenção de custos, melhor utilização dos considerados parcos recursos, também pode fazer uma coisa mais modesta, simples e econômica: um cocktail com menos convidados! Diálogos públicos sobre o desenvolvimento!

 

E esses dinheiros todos poderiam ir para outros fins sociais que temos tantas necessidades, ou para melhorar a nossa famosa EN1. Não resolveria todos os problemas do país, é certo, mas resolveria um ou outro, o que não é menos importante.

 

ME Mabunda

terça-feira, 29 novembro 2022 12:39

E o tabefe veio do distrito do Lago!

Dispõem alguns dicionários da língua portuguesa que ‘tabefe’ é uma “pancada (leve) desferida com a palma da mão com o objectivo de desmoralizar a pessoa que é atingida. Sempre funciona, mas pode sofrer retaliações agressivas.”

 

E o ‘tabefe’ veio justamente do distrito do Lago, naquilo que a história registou nalgum momento como a esquecida província de Niassa. Os líderes locais, outorgando estarem a falar em nome da população local, interpelaram a governadora provincial que lhes ia apresentar o quarto administrador num espaço de um ano! Alto e em bom tom, tête-à-tête, a população, representada pelos seus líderes, foi clara, concisa e directa: não a mudanças constantes e abruptas de administrador do distrito! Essa prática, segundo argumentaram, compromete a governação e influencia negativamente a agenda de desenvolvimento, porquanto criam descontinuidade rítmica do desempenho na implementação dos programas do governo. E pediu mais: que doravante se lhes explique as razões porque tiram determinado administrador e se lhes consulte no processo de nomeação de outro. Como quem diz: pedimos respeito, consideração e humanidade!

 

Justíssimo.

 

Há uns bons meses, chamava eu atenção, neste espaço, sobre o (des)tratamento que dispensamos à figura e posição de administrador de distrito. Primeiro, fazia notar que, aparentemente, a indicação de administradores de distrito não seguia regras claras, coerentes e conhecidas, dependia muito da disposição e boa vontade dos portentores das canetas - o dia em que acordassem mal dispostos, riscavam num papel e… pimba, e assim decidiam pela exoneração e indicação de um administrador de distrito. Outro dos aspectos que levantava é que, no actual esquema, um administrador tanto pode durar… quatro meses (como o do Lago), como pode ficar anos a fio!… Mais importante ainda, observava eu que, muitas vezes, são nomeadas pessoas sem as qualidades fundamentais desejadas para o nosso contexto histórico e temporal: serem campeãs/promotoras/instigadoras de desenvolvimento!; sem liderança, sem capacidade de gestão, sem conhecimentos essenciais e sem experiência ou obra conhecida.

 

O que a população do distrito de Lago pediu não é algo de outra galáxia. Como disse acima, é justíssimo. Em sociedade onde se cultiva a ética, boa governação, moralidade e respeito pelo humano, é assim mesmo. Não se nomeia uma pessoa para determinada posição, qualquer que seja, incluindo, ou sobretudo, a de administrador de distrito, só por se nomear, porque detemos a prerrogativa de nomear! Não se nomeia alguém somente por ser família, amigo ou amiga. Não se nomeia alguém hoje e, passados quatro meses, ou três ou seis, tira-se-lhe! Também, muito importante: não se desnomeia alguém sem se indicar as razões de tal exoneração ou demissão; em respeito não somente ao nomeado, como também e sobretudo à sociedade!

 

Nomeia-se alguém por se lhe reconhecer competência e dedicação suficientes e necessárias para essa posição. Pessoa com capacidades de gestão e de liderança, com conhecimentos necessários e suficientes para a posição em causa. Pessoa dedicada ao trabalho, com experiência suficiente em determinada área. E pessoa com valores humanos apreciáveis, ética, boa conduta moral e social.

 

Pode ser ou não família, amigo ou amiga! Se nós que detemos a faculdade de nomear observássemos seriamente aqueles critérios científicos, certamente que nos pouparíamos à vergonha de termos de desnomear aquela pessoa que nomeamos quatro meses depois. E de termos de apresentar quatro administradores em um ano!

 

Se calhar deve ser doloroso para quem detém a caneta, mas não devia ser. É uma questão de respeito ao semelhante, de boa educação, de ética e de boa governação que, quando se exonera alguém, apontarem-se as razões porque é tirado de onde estava. Isso, ao contrário dos que pensam que é humilhação à pessoa em causa, libertava o desnomeado de especulações, de boatos, ou de mero desprezo social. Se se disser claramente porque o tiramos, tanto a pessoa visada, como a sociedade, ficam sabendo da verdade e… ficamos todos aliviados! Limpamos as nossas mentes e vamos para outros desafios.

 

Mas voltemos à figura do administrador de distrito. Há que valorizar o distrito, na letra e no espírito, na lei e do ponto de vista econômico e financeiro. Esta prática de três a quatro administradores em um ano, de mudarmos abruptamente sempre que acordarmos mal dispostos, ou de nomearmos familiares, amigos e amigas sem as competências exigidas, mostra exactamente o contrário. Não estamos a valorizar. Tivemos, há uns anitos, um bom slogan que hoje definhou - Distrito, Polo de Desenvolvimento! Abandonamo-lo. E hoje não dizemos quase nada: os slogans têm a função galvanizadora, muito importante no desenvolvimento dos processos. Nalgum momento, demos sete milhões de meticais aos distritos, o que era excelente (podíamos aprimorar a operacionalização). Descontinuamos. E os distritos voltaram a viver dos… três milhões e seiscentos mil meticais ano!

 

Que pode um administrador fazer com três milhões de meticais ano? Que pode um distrito fazer com três milhões de meticais ano? Que condições temos, damos ao administrador e ao distrito? É por isso que as direcções distritais (hoje serviços distritais) vezes sem conta são de uma palidez de bradar os céus…

 

Vamos ser sérios e valorizar a posição de administrador de distrito. Mas vamos, acima de tudo, respeitarmo-nos como humanos!…

 

ME Mabunda

terça-feira, 15 novembro 2022 12:29

Os bolseiros moçambicanos no estrangeiro

Um post no Facebook, há uns três meses, a pedir informação a quem a tivesse sobre o paradeiro de um amigo na infância que, a partir de uma das escolas secundárias do distrito de Chibuto, fora para Cuba, em 1977, prosseguir os seus estudos, o Firmino Salvador Mabasso, valeu-me uma grande aproximação formal à Associação dos Antigos Estudantes em Cuba. Grande mesmo, se bem que com muitos deles já desenvolvera uma grande relação de amizade e de cordialidade. Agradeço o acolhimento, consideração e tratamento. Espero, porém, o deferimento do meu pedido de ser membro honorário da Associação!

 

De tal sorte que acabei sendo um dos convidados ao colóquio havido em Maputo, no dia 12 de Outubro, que serviu para assinalar o 45º aniversário do envio dos primeiros 1200 estudantes para aquele país da América Latina ‘ uma vez mais, o meu profundo agradecimento. Sobre esse evento, há poucas semanas passei aqui o resumo.

 

Desde então, ando sem muito sono. E o que me inquieta é que de lá fiquei a saber, de entre muitas outras coisas importantes, que, ao longo de todo o processo, 17 mil compatriotas foram parar na terra do Grande Fidel Castro, em prossecução de estudos em várias áreas. Estes tantos moçambicanos para lá foram, estudaram e quase todos, senão todos eles mesmo, voltaram ao país e deram o seu contributo. Uns, nas ‘diversas’ áreas em que foram formados… outros, nem tanto. Pelo que se disse, estes quadros estão espalhados por todas as áreas e por todos os distritos do nosso país. Até aqui, tudo muito bem. O que já me atravessa a garganta é a sensação que tenho de que o país não fez (e não está a fazer) o devido aproveitamento dos tantos quadros que mandou para Cuba… e não só!

 

Vezes sem conta, foi-nos dado a conhecer que a quantidades consideráveis de compatriotas foram atribuídas bolsas de estudo para diferentes países do globo. Para todo o Mundo. Cuba foi um deles. Mas lembro-me de ter ouvido também sobre a ida de estudantes para RDA - não aqueles que para lá foram trabalhar, como mão de obra -, mas os que foram prosseguir estudos, formar-se em diversas áreas também! Creio que existem/existiram às centenas! Para a URSS (para os macacos velhos); para a China, a República Popular; para a Bulgária, Jugoslávia, Checoslováquia, Hungria, Polônia e Romênia - alguma desta nomenclatura só os macacos velhos e que vão entender!… para todos estes sítios mandamos estudantes para se irem formar. Às centenas e centenas. Para Índia, Europa, África, Ásia… para todo o lado, mandamos a nossa juventude estudar. Até aqui, maravilha! Tudo muito bem! Para desenvolvermos o nosso país, precisamos de gente bem formada, com conhecimento, com saber, com ciência e este (o saber/a ciência) não conhece país de proveniência!

 

As questões que me avacalham a cabeça são: temos dados estatísticos destes envios todos nalgum lugar? Temos alguma base de dados que nos diga quantos jovens mandamos para que país ou países? Estudar o quê? Todos regressaram? Que aproveitamento o país fez/faz desses compatriotas? Há memória institucional sobre todos estes processos? Se temos, está depositada onde? No caso de existir, pesquisadores e ou o público em geral podem ter acesso?

 

Lembro-me de ter ouvido que em Cuba, na União Soviética e na RDA mandamos formar os melhores agentes dos serviços secretos que um país pode ter. Mas também mandamos formar militares de grandes qualidades e capacidades. Fizemos o devido aproveitamento? Podemos ter feito, no devido momento e a idade não para… mas, continuamos a fazer - há coisas que independentemente da idade as pessoas podem continuar a fazer? Já não têm proveito nenhum? Não têm? Parte daqueles 17 mil estudantes já não tem proveito? É isso mesmo? Como é que não têm se o país foi apanhado de surpresa numa guerra fratricida de terrorismo? Ninguem, mas ninguem mesmo, foi capaz de alertar o pais que vinha ai o terrorismo que hoje nos mata a alma, mas… temos gente formada e desmobilizamos!

 

É certo que os mandamos para casa a comprar a paz com a Renamo, mas nada obsta que esses quadros fossem recolocados nas especialidades que o país muito continua a precisar.

 

Continuamos com imensos desafios de desenvolvimento, na educação, na agricultura, nas indústrias e… nos hidrocarbonetos! E dizemos que não temos pessoas formadas! Há uns anos, ouvi que estávamos a mandar estudantes para Angola, para irem estudar petróleos… onde estão? Voltaram? Foram colocados onde? Nunca mais ouvimos nada…Não que o Estado deva empregar todos os quadros a quem dá bolsa de estudo, mas que fizesse o devido aproveitamento… para além do necessário registo!

 

Sem base de dados, sem registo estatístico sério, científico,  sem cadastro profissional, não faremos muita coisa neste nosso desiderato de desenvolvimento do nosso Moçambique!

 

ME Mabunda

terça-feira, 08 novembro 2022 07:50

Graça Machel!… pois, ela e só ela!

MoisesMabundaNova3333

Surpreendeu todo o mundo no último congresso dos camaradas na Matola. Melhor, falando brasileiramente, todo o mundo foi pego de surpresa na última reunião magna do partido sexagenário. Não foi por menos!

 

  • O quê? Ela pediu para se retirar o nome dela das listas? Não é possível isso!…

 

Esta foi a reacção, de total incredulidade, de muitos dos seus camaradas, presentes ou não na Escola Central do Partido naqueles dias 24 a 27 de Setembro passado. Até hoje, pouca gente acredita que ela foi capaz disso; pensa-se que terá havido… mão estranha (não externa) orquestrando. Mas rezam as narrativas jornalísticas que, de jure e de facto, ela solicitou que seu o nome não fosse incluído nas listas de candidatos a membros do Comitê Central. Consta nas crónicas que as razões, essas, não as apontou, guardando-as só e somente para si.

 

Crónicas de escárnio e de mal dizer, no entanto, que infelizmente pululam entre nós, atribuem-lhe a frase “se não posso falar, então não participo”! Chegaram mesmo a pôr as palavras entre aspas, como se se tratasse de citação ipsis verbis. Tamanha criatividade: ninguém indica/ou onde, quando e em que circunstâncias exactas ela terá pronunciado aquelas palavras. Produção e hábitos  de mentes férteis em esterilidades, fossilizadas, que não enxergam e nem conseguem imaginar que uma mente humana possa entender e solicitar deixar de fazer parte das listas de candidatos a posições internas do partido.

 

Uma indignação somente explicável pela obsessão cega e doutrinal que graça entre nós e da qual não nos conseguimos libertar, de nos mantermos nas posições/cadeiras quase até… à morte; ou até sermos empurrados! Com efeito, quantos camaradas que, estando acima dos oitenta anos (para não dizer 75, ou 77 como a Graça) - idade própria para mais e bom repouso - não estão ali a acotovelar-se com jovens na disputa da posição de candidato a candidato? Imensos. Quase todos. Muitos, mesmo doentes, coxeiam para ali!... Nas nossas cabeças e no nosso modus faciendi, não cabe a ideia de um auto-afastamento voluntário para uma vida menos intensa, sem empurranços, ou cotovelanços, de menos corre-corre. Preferimos morrer ali nos corredores da Escola Central. Daí a indignação quando a Mamã Graça solicita não ser mais incluída nas listas internas de candidatos.

 

Algo que é um grande e bom exemplo de conduta social, é visto como um acto de capitulação, de desistência, resignação… de tsukulanço (para os que sabem xangana). Massinguita! Para nós, está de muitos parabéns a nossa Mamãe, a nossa fonte de inspiração. Este devia ser o procedimento normal. Temos que aceitar que não somos, nem seremos eternos… as forças acabam. E temos que dar lugar a outros!

 

Mas esta não é a razão desta crónica. A razão aqui chamada é mais um fabuloso “contra-mão” justamente protagonizado, uma vez mais, pela Mamã Graça Machel!

 

Decorria, em Maputo, no dia 12 de Outubro, o colóquio de celebração dos 45 anos do primeiro envio de estudantes moçambicanos a Cuba. Havia para aí dois painéis para abordarem, cada um de sua perspectiva particular, o tema. Terminara o primeiro painel, portanto, tinham intervindo para aí seis oradores, além dos seis que tinham tomado a palavra na sessão de abertura - portanto, haviam falado para aí umas dez pessoas. Todas elas, na sua parte de epítetos,  não se tinham esquecido, nem se espreguiçado de dizer, alto e bom tom, “Sua Excelência aqui”, “Sua Excelência acolá” - já que havia muitas “excelências”, mas sobretudo figuras que no passado exerceram funções de estado - e mais “Sua Excelência isto e aquilo” e Sua Excelência Graça Machel, Antiga Ministra da Educação e Cultura… e mais isto mais aquilo!

 

Após terminar o primeiro painel, é chamada ao palco para receber um galardão em reconhecimento da sua contribuição em todo o processo de envio de estudantes para Cuba. Sempre com o seu riso e sorriso, recebeu o presente e, com ele nas mãos… a xingove xi dibe mutchovelo (o gato entornou o caldo)!

 

Não tinha sido ainda convidada a usar da palavra, mas, perto do palanque, apoderou-se do micro e disse, “já que estou aqui [no pódio], vou aproveitar dizer duas, três coisas…” E tomou um ar sisudo, aquele que lhe é característico, mas nem por isso a sua voz perde/u o familiar traço sibilante: “Essa coisa de Sua Excelência aqui, Sua Excelência acolá… já estou cansada… estou cansada! DEIXEI DE SER MINISTRA HÁ MUITOS ANOS, MUITOS! DEIXEI DE SER SUA EXCELÊNCIA HÁ VÁRIOS ANOS… PEÇO, POR FAVOR, QUE DEIXEM DE ME CHAMAR SUA EXCELÊNCIA! CHAMEM-ME TÃO SOMENTE MAMÃ GRAÇA!… MAMÃ GRAÇA! OUVIRAM?!...POR FAVOR!” - e, com o seu olhar acutilante, desafiou a plateia por alguns instantes, como se quisesse perceber se alguém tinha dúvida ou contestava. Depois, seguiu dizendo a segunda e a terceira coisa que tinha.

 

Toda a audiência ficou, naquele instante, estarrecida, hipnotizada!

 

Que Granda sabedoria da Senhora Mamã Graça Machel! Que Granda Graça Machel! Tal como na “batalha campal” para se estar nas listas internas de candidatos a candidatos, muitos morrem por quererem que se lhes continue a chamar de Sua Excelência… não conseguem enxergar que já não estão em exercício, não são mais o que eram... Interessantemente, ao longo do colóquio, houve, inclusivamente, até, quem não preferisse ser chamado de antigo dirigente, mas que se lhe chamasse como se lhe chamava na altura!… A nossa sociedade, lamentavelmente!

 

Parabéns, Mamã Graça Machel! Pela sua humanidade, humildade e simplicidade! É claro que continuaremos a chamar-te Sua Excelência, não porque exiges, não porque fazes questão, mas por reconhecer e assumir a sua grandeza, o seu carisma, humanidade e, não menos importante, a sua humildade!

 

A grandeza das pessoas está também e sobretudo nestes valores sublimes; autoridade e legitimidade não se capitaneam, jamais são fascistas, nem precisam de ser vigiados ou auto-vigiados permanentemente! São naturais! E o reconhecimento é também natural!

 

ME Mabunda

MoisesMabundaNova3333

O 12 de Outubro deste ano foi um dia triplamente especial! Foi/é o Dia do Professor Moçambicano. Foi o dia em que, no distante ano de 1977, os primeiros 1200 estudantes moçambicanos partiram para Cuba para prosseguirem com os seus estudos. E, terceiro, neste ano, passam precisamente 45 anos depois da “façanha”, desse acto extraordinário protagonizado pelos governos cubano e moçambicano, dirigidos na altura, respectivamente, por Fidel Castro e Samora Machel! Neste dia, há 45 anos, os dois chefes de Estado visitaram, pela primeira vez, as “escolas moçambicanas" em Cuba. E esta foi, diga-se em abono da verdade, a primeira experiência no mundo inteiro de envio de estudantes secundários de um país para prosseguirem estudos num outro!

 

Conforme diria o Eng. Castigo Langa, antigo professor em Cuba, durante a visita do Presidente Fidel Castro a Moçambique, a 21 de Março de 1977, o Presidente Samora Machel solicitou ao seu homólogo o envio urgente de professores. Considerando todas as dificuldades que o país enfrentava, nomeadamente a exiguidade de infraestruturas escolares, falta de material didáctico, grande dispersão das crianças, o presidente Fidel Castro entendeu que não seria suficiente enviar professores e, por isso, ofereceu-se a abrir escolas em regime de internato, inteiramente dedicadas às crianças moçambicanas. Tratava-se de um gesto de grande nobreza, uma vez que Cuba não é um país rico. Era o profundo sentido de solidariedade para com outros povos que explicava tamanho sacrifício.

 

Mais pela passagem do 45० aniversário da ida dos primeiros estudantes para Cuba, houve um interessantíssimo colóquio numa das salas de conferências da cidade de Maputo, reunindo mais de 200 pessoas, entre os próprios estudantes, docentes moçambicanos que foram destacados para aquele país, antigos dirigentes e outros em exercício e convidados. Joaquim Chissano, Armando Guebuza, Graça Machel, Júlio Braga, Zacarias Kupela, Castigo Langa, Tobias Dai, Hama Thai e o actual Embaixador de Cuba em Moçambique são algumas das personalidades que faziam a sala.

 

O leit-motiv do evento foi, como bem disse o Professor José Castiano, um “cubano” por excelência também, olhar para o passado com os olhos postos no futuro. E a questão fulcral foi: qual é o legado deste “glorioso” passado para as gerações futuras? Sobretudo quando, como diria Aniceto Dimas, Coordenador da Comissão Organizadora das Celebrações dos 45 anos da Criação das Escolas Moçambicanas em Cuba, esta geração espreita a terceira idade!

 

O gosto pela pesquisa e o inconformismo na conquista do saber; o sentido de missão, de cumprimento do dever; o amor ao trabalho; o patriotismo, saber viver para a Pátria, ser útil à sociedade através da elevação da consciência política; a solidariedade, o desenvolvimento da empatia; o colectivismo, espírito de equipe, coesão de grupo; e o internacionalismo são alguns dos valores supremos que os 17 mil moçambicanos que se fizeram às terras de Fidel Castro trouxeram/trazem como legado para o país, nas palavras de Dimas. Valores que, de uma ou de outra maneira, vão lamentavelmente escasseando na nossa actual Sociedade.

 

Para o Professor Eduardo Sitoe, a relevância e especificidade do modelo adoptado nas escolas moçambicanas em Cuba radica na clara visão da UNESCO de que “devemos aproximar as pessoas e reforçar a solidariedade intelectual e moral da humanidade, através da compreensão mútua e do diálogo entre culturas”. Outrossim, o cerne desta filosofia residiu na ideia de ter professores cubanos e direcção cubana, mas escolas moçambicanas e a formarem estudantes moçambicanos, uma formação humana integral que garante o desenvolvimento humano em todas as suas dimensões.

 

E o impacto é claramente incomensurável, segundo o Professor Sitoe. Os moçambicanos formados em Cuba estão em todos os cantos deste país, em diversas áreas de actividade e em diferentes níveis de responsabilidade; todos os estudantes moçambicanos em Cuba são PATRIOTAS; e Samora queria que a oportunidade de ir estudar fosse dada a crianças, pobres mas promissoras, filhos de operários e camponeses. A ideia era deixar a mensagem de que, com a Educação, é possível mudar o destino de crianças e das suas famílias e, por via disso, transformar para melhor o nosso destino colectivo, como Nação e como País.

 

O debate e contribuições foram imensas e riquíssimas - pena que a cobertura jornalística foi parca e desfocada. Quase todas as figuras de proa intervieram e deram as suas ideias, valiosíssimas, sublinhe-se. Uma das ideias foi a do Dr. Edgar Cossa de construção de uma lápide no Parque de Campismo, local onde todos os 1200 estudantes provenientes de todos os distritos do país se concentraram e se despediram do Governo a caminho de Cuba.

 

Intervenção mais emotiva foi a da… Mamã Graça Machel… doutro modo não seria!... Naquela sua sempre voz sibilante e sem papas na língua, declarou-se vigorosamente discordante da colocação de que a "geração cubana”, estando a espreitar a terceira idade, tem somente que transmitir o legado, entregar o testemunho. “Nao aceito isso… o país tem desafios muito grandes, a pobreza absoluta graça em 45 por cento dos moçambicanos; ainda temos regionalismo e tribalismo devastando este país… e vocês falam de estar a entrar para a terceira idade… eu tenho 77 anos, mas ainda estou a lutar e vocês… Vocês, com toda força que têm: estão em todos os distritos do país; estão formados em várias áreas de saber; ocupam diferentes cargos e posições em várias áreas da vida do país… não, não! Não aceito… isso me atravessa a garganta! Vamos lá continuar a dar o nosso contributo a este país!"

 

Uma mensagem muito clara, concisa e directa, inspirada, talvez, em Marcelino dos Santos, o poeta Kalungano, que uma vez disse: “Enquanto houver revolução por fazer, não há tempo nem espaço para morrer”!

 

Muito obrigado, Mamã Graça, pela mensagem cristalina! Fazemos dela nossa!

 

ME Mabunda

terça-feira, 25 outubro 2022 12:53

Sobre o Fundo Soberano

O Governo submeteu há dias à Assembleia da República um projecto de lei que cria o Fundo Soberano, na expectativa de o ver debatido e aprovado ainda nesta sessão que começou na primeira semana de Outubro corrente.

 

Está de parabéns o Executivo, porquanto a pressão do tempo era/é enorme: este mesmo mês de Novembro, Moçambique vai começar a receber os primeiros valores decorrentes da exploração dos seus recursos naturais, especificamente do gás natural da chamada Bacia do Rovuma e não existe até ao momento qualquer instrumento que norteia a aplicação desses valores, bem como dos valores decorrentes de mais valias em diferentes situações de exploração dos nossos recursos, como os casos de vendas ou trespasses de acções entre as multinacionais exploradoras dos nossos recursos. Já tivemos trespasses na Bacia do Rovuma e em Tete e muitos de nós não estão informados sobre a aplicação desses fundos.

 

Portanto, é imperioso que haja um instrumento que oriente a aplicação dos valores que vão ser recebidos com a exploração dos nossos recursos naturais, sejam receitas de exploração, ou impostos e ou mais valias decorrentes de transações diversas. E este instrumento orientador devia/deve reflectir a vontade colectiva dos moçambicanos. O mote aqui é que os recursos naturais pertencem aos moçambicanos, a todos os moçambicanos e, assim sendo, devem/deviam ser estes a estabelecerem a geometria da sua exploração, bem como da aplicação dos dividendos decorrentes dessa exploração. A lei do Fundo Soberano deve ser inclusiva, albergar as aspirações de todos nós, e não apenas daqueles que neste momento estão no comando, pois, como estamos todos de acordo, os recursos naturais, bem como os proventos da sua exploração, são de todos nós moçambicanos e, assim sendo, devem beneficiar a todos os moçambicanos e às gerações vindouras. 

 

Talvez devido à pressão do tempo, o Governo tenha apressadamente esboçado o draft da referida lei e submetido ao parlamento. Aceito que houve auscultação a diferentes sensibilidades nacionais, mas acho que deve haver mais auscultação e, se possível, haver explicação pública de como tal auscultação foi realizada, quais essas sensibilidades e como foi o processo. Inclusão e participação, é tudo quando se apela.  Não podemos somente ver no jornal que há um seminário sobre isto e aquilo e que… o Banco de Moçambique vai apresentar isto mais aquilo!

 

Olhando para o draft propriamente. A justificativa do draft submetido devia ser mais bem trabalhada. Como está, só espelha grandemente a pressa que se tem em encontrar um instrumento legal que balize as nossas actuações. A parte introdutória deve ser de uma grande solidez, abrangente, universalizante, bem alinhavada, apontar de forma clara e inequívoca que se trata de um instrumento que visa regrar sobre os proventos da exploração dos recursos naturais de Moçambique no seu todo e não apenas da dos blocos A ou B “e outros” ou “etc.”

 

Em termos de conteúdo. Julgo aceitável a ideia de que os proventos devem ser divididos pela utilização presente e futura. Isto é, uma parte reforçar o orçamento do Estado actualmente e a outra ser conservada e ser aplicada em empreendimentos virados para o futuro. Não abono é a ideia de que todos os valores deveriam ir para o Fundo Soberano. O nosso Orçamento de Estado ainda é deficitário e, por isso, financiado ou apoiado por instâncias estrangeiras, o que de alguma forma cerceia a nossa independência, soberania e autonomia. As nossas necessidades são imensíssimas e, portanto, não seria de uma mente sadia que, estando-se a passar fome numa casa e obtendo-se alguma renda, esta seja conservada para gerações vindouras.

 

Onde tenho sérios problemas é no que diz respeito à utilização do exacto Fundo Soberano. O draft da lei sobre o Fundo Soberano fala de uma "política de investimento do Fundo Soberano” a ser definida pelo Governo… Ou seja, vai ser aberta uma conta do FS no Banco de Moçambique na qual se vai depositar uma parte dos fundos provenientes da exploração dos recursos naturais, os quais serão utilizados de acordo com a “política de investimentos” a ser delineada pelo Executivo. Discordo.

 

Minha visão é que devemos definir aqui e agora o que fazemos com o Fundo Soberano, a parte que irá para a conta a ser aberta no Banco de Moçambique. A lei sobre o Fundo Soberano deve estar completa e estar completa significa que deve também especificar o destino dos valores a entrarem. Não acho que devamos ser como a maioria dos criadores de gado do nosso país, que se contenta apenas em contemplar a quantidade de cabeças que tem no curral e está à espera de ver o que vai fazer com elas… tipo nós que só vamos ver o saldo da nossa conta e não temos ideia clara do que fazer com aqueles fundos… que até são magros… estamos à espera de decidir o que fazer com eles. Não. Esta questão tem que estar fechada já. Tomarmos uma decisão colectiva e consensual sobre onde aplicar os fundos provenientes da exploração dos recursos naturais.

 

Já agora: acho que o Fundo Soberano deve ser aplicado na construção e reabilitação de infra-estruturas, só e somente só. Por infra-estruturas, quero dizer estradas estratégicas e estruturantes, isto é, as primárias e secundárias, pontes estratégicas, nacionais, regionais e provinciais; linhas férreas regionais e nacionais; e barragens e centrais eléctricas de âmbito nacional e regional. Penso que um país com excelentes infra-estruturas será um bom “legado” para as gerações vindouras.

 

Espero que a Assembleia da República lime bem esta parte. Não pode ficar em aberto onde aplicar o Fundo Soberano. E a AR pode, igualmente, proceder a uma auscultação mais alargada a complementar a já feita pelo Governo, mesmo que isso implique que a lei venha no próximo ano.

 

ME Mabunda

quinta-feira, 20 outubro 2022 18:14

Fikani

MoisesMabundaNova3333

Fikani! Alguém me explica o que esta palavra, noção, conceito ou processo quer exactamente dizer no contexto em que está a ser (foi)  aplicado? Qual é mesmo o conceito? O que se pretende efectivamente? Um movimento, uma força que vise relançar o turismo em Moçambique, ou que? Em Moçambique, ou na região sul?…

 

Curiosamente, ‘fikani”, na língua Xangana, uma das minhas duas línguas maternas (Xangana e Português), quer dizer ‘chegais’; é o imperativo do verbo Xangana ‘Ku fika’, correspondente ao verbo ‘Chegar’ na língua portuguesa. Imperativo subsume uma ordem, ‘cheguem’! É, portanto, um comando, uma instrução!

 

Não que eu esteja contra qualquer que seja a coisa. Mas também, não porque esteja a favor. E mais ainda, não porque seja neutro. NÃO. Pura e simplesmente, gostaria era de perceber de que se trata; ou de ter percebido de que se estava a tratar... Não podia ser, por dever intelectual e moral, contra, ou a favor, ou ainda neutro com relação a algo que não perceba…

 

Admito que, apesar de ser um viciado leitor de notícias, este processo - acredito que seja um processo - pode ter-me passado ao lado - distração ou negligência são parte dos atributos de um humano! Sendo esse o caso, acho, então, que há-de ter passado ao lado de muitos compatriotas não “viciados em ler jornais”! Trocando em miúdos: se uma informação sobre um processo desta envergadura passou ao lado de um “caça-notícias”, como é que não há-de ter passado ao lado de quem… lê por ler, não obcecado de notícias?

 

Do nada… pimba… ‘Fikani’! De um dia para o outro, passamos a ser bombardeados com o ‘fikani’ aqui, ‘fikani’ acolá!… ‘Fikani’ Moçambique!… que não é um correspondente efectivo do apelativo, em português, ‘cheguem’!… nao e, nao!

 

Decisões desta envergadura precisam ser socializadas. Não podemos surpreender os cidadãos com estes termos, ou iniciativas, processos, movimentos, etc.; e, logo a seguir, pretendermos que colaborem, sejam intérpretes, divulguem, sejam embaixadores (campeões) de ideias, conceitos ou processos que desconhecem e… não menos importante, não foram envolvidos na sua arquitectura! É justamente por isto que, não poucas vezes, belíssimas iniciativas morrem no berço e desamparadas!…

 

Temos de aprender bem, e compreendermos, o que significa inclusão, participação, socialização no processo de convivência social. Todos os dias dizemos de boca cheia que somos ou pretendemos uma sociedade de inclusão, onde os cidadãos são achados no processo de discussão dos assuntos sociais… onde os indivíduos são envolvidos, engajados, consultados…

 

Muito gostaria de ter visto a ministra do Turismo a lançar uma campanha… sei lá qual seria o nome… de preparação de uma iniciativa… chamada ‘Fikani’… para o que solicitava ideias, contribuições, participação, etc., etc. Isto, sim, seria o que se chama de SOCIALIZAÇÃO!

 

Mas… ok… para todos os efeitos, FIKANI!

 

ME Mabunda

Pág. 5 de 11