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terça-feira, 14 janeiro 2020 04:02

Relato de um sobrevivente da insurgência em Cabo Delgado: “Decapitaram cinco companheiros à minha frente”

“Os insurgentes não são pessoas para brincar. Além de corajosos são cruéis” – conta um dos 12 pescadores sobreviventes que, no mês de Dezembro, caíram nas malhas dos atacantes que, há mais de dois anos, criam terror em alguns distritos da província de Cabo Delgado.

 

Hoje internado na ortopedia do hospital provincial de Cabo Delgado, em Pemba, Abacar Cheba, de 48 anos de idade, ainda lembra o episódio como se tivesse acontecido hoje e explica: “Eu estava na companhia de outros 11 colegas, todos pescadores da mesma aldeia de Ilala, a que outros chamam de Cobri, fomos à praia pescar. Saímos de casa de bicicleta até à praia de uma zona chamada no Abibo, não muito distante da aldeia Pequeue.

 

Estávamos na praia, a puxarmos as redes, quando vimos os insurgentes a vir pelos coqueiros. Eram cinco homens, vestidos com farda das Forças de Defesa e Segurança. A dada distância, chamaram-nos e todos fomos. A nossa ideia era de que se tratava de agentes das Forças de Defesa e Segurança e que tínhamos de colaborar. Quando nos aproximamos, eis que nos puxaram a todos para o mesmo lugar e começaram a disparar. Primeiro para as pernas para não fugirmos, mas naquela confusão alguns dos meus colegas, mesmo com tiros, conseguiram fugir, tendo sido socorridos e levados para a aldeia Pangane, num barco a motor e de lá para o hospital de Macomia e, finalmente, foram transportados para Pemba”.

 

A vítima conta mais: “Naquele instante, os meus cinco colegas teriam sido mortos e decapitados à minha frente. Eu escapei porque enquanto atiravam quatro tiros para a minha perna esquerda, eu gritava «não há Deus, apenas um único criador», em língua árabe, foi daí que me deixaram, dizendo que «este era muçulmano». Disseram-me que iria ser salvo no hospital, levaram o nosso peixe, e as nossas bicicletas foram ali mesmo destruídas e então foram-se. Dali fiquei inconsciente até que, no dia seguinte, veio o grupo de pessoas da aldeia para enterrar os corpos dos meus colegas e eu fui resgatado”.

 

No hospital, diz estar a sentir-se bem devido aos tratamentos, entretanto, confessou que estava mais chocado quando ouviu dizer que a sua aldeia fora novamente atacada na última sexta-feira. Pelas notícias que recebeu, a sua casa foi de novo incendiada, os seus bens que estão enterrados numa mata, podendo apodrecer no esconderijo, porque a sua esposa e filhos migraram para Mocímboa da Praia, onde foram acolhidos em casa de irmão. (Carta)

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